Peter, menino ainda, foi
trabalhar de cobrador em uma corretora, esperto na sua bicicleta, atravessava a
rua sem olhar, achava isso o máximo, as pessoas viam e me falavam,
Quando chegava em casa eu zangava
com ele, mas não adiantava, nem sei como escapou só Deus para proteger. Agora
Sandra, já fazia cursinho para prestar vestibular, Selma fazendo segundo grau, Peter,
Kenia e Kelly ainda no Grupo Bueno Brandão na Praça Tubal Vilela, ainda hoje é,
lá na Praça do Agostinho!
Kenia sempre muito sensível, a
Kelly tomava todas suas dores e protegia, mas também sabia mexer com os
sentimentos dela e aprontava... Um dia uma colega fez alguma coisa com Kenia, na
saída da aula Kelly foi tomar satisfação, ela era pequena metida a valente, falou
alguma coisa e a menina veio querendo brigar, ai já viram... Juntou uma porção
de alunos, a Kelly pegou a pasta e começou a rodar e foi juntando, juntando... Peter
trabalhava na sobre loja de um prédio na esquina, de longe viu o ajuntamento, depressa
reconheceu a Kelly, foi la e a levou para casa.
Era sempre assim, precisava ficar
de olho nela... Um dia ela fez coisa errada, zanguei, ficou revoltada e falou
"vou embora dessa casa“ entrou e foi arrumar as coisas para ir, falei que
tudo que tinha foi eu que tinha dado e que ela não teria nada para levar.” Então
saiu de short e havaianas virou a esquina e assentou no portão da próxima casa,
deixei que ficasse ali até quando quisesse, pedi à moça que trabalhava conosco
para ficar observando ao longe sem ela saber, ficou, Ficou... quando deu
vontade de fazer xixi saiu correndo, chegou em casa, fiz que não vi, entrou
para o banheiro, saiu sem graça e nunca mais falou em sair de casa.
Na esquina próxima a nossa casa
estavam construindo um prédio de muitos andares, fazendo as perfurações, era
caminho das duas ao vir da escola, os buracos eram muito profundos, sempre que
passavam perto a Kelly ameaçava se jogar nos buracos para ver a Kenia ficar
apavorada e pedir “pelo amor de Deus não faça isso!" “não sei quem essa
menina puxou!”.
Em Uberlândia, foi ficando difícil ir a Curvelo,
já éramos muitos, o fusca ficava muito apertado durante a longa viagem, geralmente
precisávamos parar para dormir, costumávamos gastar dezessete horas, Soares
ficava inventando caminhos, estradas de terra, e a velocidade que já falei, não
tinha quem aguentasse... Era assim, na frente Soares dirigindo, eu ao lado com
a Kenia em uma cadeirinha entre nossos bancos, ainda usando fraldas de pano, e com
disenteria, nos meus braços Kelly bem gordinha e desinquieta, entre minhas
pernas na frente ia uma lata de dezoito litros com, bananas, laranjas
descascadas, sanduíches, águas, leite para as mamadeiras da Kelly.
No banco de trás os três maiores,
brigando, cada um queria mais espaço, a Sandra enjoava e vomitava, ficava muito
pálida, passava muito mal nas viagens. Parávamos nos postos para abastecer e
comer algumas coisas, Soares deixava gorjetas para os garçons, antes que os
garçons pegassem, os meninos pegavam depois no carro iam dividir a grana e
tinha brigas nunca chegavam a um acordo, o pai virava fera, levava a mão para
trás, em quem acertasse seria aquele...
Não me esqueço de uma vez em que passávamos
por Uberaba, por uma estrada de terra já quase noite, chovendo forte, longe de
posto de combustível. Naquela época viajávamos horas sem passar em nenhum
posto, era raridade, às vezes levávamos tambores de gasolina, acho que por isso
as crianças enjoavam tanto, o cheiro era insuportável. Bem, como ia dizendo, o
limpador de para-brisa estragou o motorzinho, assim ele justificou, então
amarrou um cordão e me deu a ponta para segurar, era para ficar puxando, senão
parava. Imagina a Kelly no colo dormindo eu com uma lata entre as pernas que
não aguentava mais em ficar naquela posição, ainda fazendo força para puxar a corda,
veja minha situação.
Quando doía o braço, a corda bambeava,
o limpador parava, e vai bronca... Chegava... Que beleza... Mais quase morta...
Depois de alguns dias, começava a sofrer pensando na volta.
Com essas dificuldades fomos
demorando mais tempo sem ir ver nosso povo, fomos perdendo o convívio gostoso, as
formaturas, os batizados, os nascimentos... Meus irmãos, solteiros foram para
Belo Horizonte, estudar e trabalhar, eram Lucia, Ângela, Tânia e Marcio
alugaram um apartamento e moravam juntos Loudinha, já tinha montado um salão de
beleza e estava bem, ficou em Curvelo. Papai, ainda tinha o retiro, mas a casa
ficou vazia... estava mesmo muito ruim...
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