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sexta-feira, 6 de julho de 2012

O câncer




Eu sentia que estava muito doente... Segurava as pontas, porque sabia que não podia fraquejar, era o esteio de tudo em nossa casa. Mas um dia não teve jeito... Fui ao medico, me pediu uma batelada de exames... Eu estava mesmo com um caso sério... Precisava fazer uma biopsia, o medico me falou muitas coisas, fiquei assustada...
Sentia que estava no meu limite. Mandou chamar o marido e contou o que estava acontecendo... Eu preocupava com as crianças menores, que ainda precisavam muito de tudo... Já estávamos na metade do ano, tinha muitas roupas de casamentos para serem feitas, chegando também o ano da formatura da Sandra, estava feliz, minha filha seria uma doutora... Sentia um grande orgulho disso, fazia de tudo para que ela participasse de todas as viagens da turma, dos projetos Rondon, sempre me esforcei para fazer as roupas da moda, para que ela não se sentisse inferior às colegas...
Em um dos projetos Rondon, Sandra conheceu o Nei Marcos. Ele era de Juiz de Fora. Voltou e não se viram mais. Um dia eles se encontraram na faculdade, o Nei já tinha se formado e veio trabalhar em Uberlândia, ai começaram a namorar.
Havia um médico que era nosso amigo, porque eu costurava para esposa dele, e às vezes ela pedia que a Kenia fosse dormir em casa deles, ficar com os filhos para irem a alguma festa. Então por isso, essa atenção dele para comigo. Chamou-me ao consultório, e disse-me que precisava tomar providência rápida que eu estava com câncer no colo do útero, e que era muito sério... Teria que ir para Belo Horizonte, fez uma carta para o médico que indicou contando toda a história...
Minhas filhas choravam pelos cantos... Não diziam nada, mas não precisava eu sabia o tanto que estavam sofrendo, eu pressentia que o chão fugia dos meus pés... Como seriam aqueles filhos sem mim? O que seria deles? Longe da minha familia, de meus pais e irmãos! O Soares apesar de ser bom pai, eu não confiava... Era ríspido demais para os filhos, somente a opinião dele valia.
Estava mesmo sem saída... Deus é misericórdia... Não desampara seus filhos quando estão na pior... Quando se está no fundo do poço, vem uma pequena luz, para trazer esperança... Sempre acreditei Nesse Pai de bondade. E nos anjos que Ele coloca em nosso caminho.

Naquela tarde, véspera da viagem para BH, o correio entrega a correspondência, advinha! Chega a autorização para a compra da casa, aquela!... Sonhada... Como festejar? Não tinha clima! Nada podia resolver naquela hora! Quando voltar se voltar... Resolveremos... A viagem para BH naquela época durava umas quinze horas, como já disse as estradas eram precárias, e o motorista não passava de oitenta quando a estrada estava melhor!

Chegando fui direto para o hospital, meus irmãos já tinham providenciado tudo, o médico indicado já estava esperando, e leu a carta, e deu inicio aos procedimentos, me disse que não podia me dar garantia da cura, mas iria fazer o possível para dar certo... Levou-me para o centro cirúrgico, anestesiou-me, e introduziu em mim o aparelho de radioterapia, me colocaram de barriga para cima, sem direito de mexer nem com a perna, fiquei naquela posição por setenta e duas horas, isso foi no final de setenta e nove, era assim, longe da tecnologia de hoje!
No hospital São Lucas, as freiras foram me visitar, e rezar por mim, me lembro de que deviam ser umas três, estava ainda anestesiada, ouvia ao longe... Elas comentando uma para outra, "Coitada tão novinha, cinco filhos! Quem irá cuidar deles?" Eu ouvia o assunto não conseguia manifestar, tinha a certeza no meu coração que ia sair dessa. O capelão foi lá me ungiu, foi a segunda vez que fui ungida, vocês sabem que unção é o ultimo sacramento que é dado ao doente desenganado. Para mim foi a maior bênção que já recebi. 

Depois de uma semana, o médico me deu alta, sentia uma terrível cólica, no reto, nos rins, no abdômen, evacuava sangue vivo... Dores insuportáveis... Me disseram que era assim, com o tempo passava... Só que esse tempo demorava muito para passar... Entrei no carro e do hospital mesmo vim embora, enfrentar novamente àquelas horas de estradas, agora deveria demorar mais porque eu estava deitada no banco traseiro e com dores, teria que andar devagar... Preocupada em chegar em casa, o serviço esperava, era festa de formatura da minha filha, além disso, tinha dezoito vestidos de colegas da Sandra para fazer e mandar bordar.
As despesas do hospital meus irmãos juntaram e pagaram para mim, só Deus poderá recompensa-los.
Aos trancos e barrancos dei conta dos compromissos, mesmo escorada em uma mesa com muitas dores e parando a todo momento para ir ao sanitário
Chegou a grande noite de gala... Fui revestida de uma força que não era minha... Coloquei um sapato de salto, dancei toda noite, chegando em casa pela madrugada ainda fui fazer uma galinhada para o Nei e os colegas dele que tinham vindo para trabalhar na universidade e moravam em uma republica.

Depois tive um acompanhamento de cinco anos seguido com o mesmo médico Dr. José Henrique Rocha, ele veio a falecer, eu ainda continuei com o assistente dele, Dr. Salvador Pitchon, foi quem declarou que eu estava curada.


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