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domingo, 4 de dezembro de 2011

A viagem de lua de mel


A viagem de lua de mel já estava programada, iríamos de jardineira para BH no domingo ficaríamos em um hotel por poucos dias. Depois de uns dois dias recebemos visita de uma parenta dele, que era dona de uma pensão perto da Praça Raul Soares e convidou-nos para ficar lá um dia, mais que depressa ele aceitou, a moça era muito agradável e alegre e Sebastião pelo jeito tinha bastante amizade.
Fomos para a pensão,no dia seguinte partiríamos para Santo Antonio do Rio Abaixo, terra do querido marido,o mesmo não ia lá desde o tempo da guerra...Volto a falar nisso...Preciso terminar de contar o que sucedeu na pensão...prometi ser verdadeira e não deixar nada pra trás.
Naquela noite vi que os quartos eram em um corredor comprido... Fechando com o banheiro para todos o hóspedes. Fiquei imaginando como seria para ir fazer xixi na madrugada!!! Tinha medo do desconhecido, aquilo estava muito estranho... Como seria? Sempre achei soluções para as coisas simples, e isso era coisa simples.
Entramos para o quarto, junto com a dona que nos mostrava tudo, e dava as boas vindas, eu só prestava atenção no que tinha dentro e qual seria a minha saída... Achei... Achei... Não falei guardei só pra mim, já estava resolvido meu problema. Havia uma porta que dava para uma sacada de frente para avenida, era mesmo espetacular... Reparando mais, vi em cima do guarda roupas um globo daqueles de colocar nas lâmpadas em formato cônico, isso não ia preocupar mais.
A moça nos leva pra conhecer o resto da pensão, muito atenciosa nos serve sucos, pasteis, bolos etc. Ficou até tarde pondo as fofocas em dia, recordando de pessoas que eu não conhecia. Eu apesar de tudo, era muito tímida com quem não convivia... Tudo estava sendo novo para mim, agora era tratada de senhora, Dona, e ser respeitada como tal.
Terminadas as conversas, fomos dormir, foi só um pequeno sono, acordo com vontade de fazer xixi, pensei, ir naquele corredor escuro jamais! Lembrei do plano, para pegar o globo lá no alto teria que subir na cadeira que estava ao lado da cama sem fazer barulho pra não acordar o marido tinha que ser muito sagaz, ou melhor, esperta, fazer uma rodia com a anágua, que era bem engomada a fim de equilibrar o globo e fazer ali, depois pensa no restante... Logo me veio a idéia, olhei pela sacada e vi a copa de uma arvore e uma marquise que não me deixava ver o passeio, era silêncio total... a rua estava deserta... Advinha!!! Joguei na arvore!
No mesmo momento saem de debaixo da marquise, dois homens que iam passando assustados, só ouvi dizerem: "olha, veja só, está chovendo!" O outro respondeu, "Viu é só debaixo da arvore, isso é um aviso pra nós”, o outro diz é mesmo credo!
No quarto tinha uma pia com torneira, lavei o globo e coloquei no mesmo lugar, não ficou nenhuma pista do que tinha acontecido. Dia seguinte, tudo normal, fomos almoçar em casa dos pais dele, e a tarde seguir viagem para Santo Antonio do Rio Abaixo, nunca tinha feito viagem mais longa, estradas estreitas de buracos com muitas curvas encima de serras, dava pra ver as copas dos coqueiros e muito perigosa, essa era minha visão.
Lá no alto da serra do Cipó havia uma construção antiga, que chamavam de palácio, acho que lá deveria ser um hotel não tenho certeza. Os passageiros enjoavam, um rapaz estava em pé na jardineira, o lugar dele vago, depois observando podemos notar que ele estava com disenteria, e que a calça estava cheia!!!
Coitado, estava muito envergonhado... Com os solavancos da jardineira a coisa foi ficando feia, até que chegou em um ponto de parada, ele foi o primeiro a descer, Sebastião ofereceu a ele uma calça, que o moço aceitou prontamente, agora é pegar a mala no bagageiro, foi falar com o dono da parada para arranjar um lugar pra ele tomar um banho pra seguir viagem e jogar água na jardineira que ninguém aguentava de tanto odor.
Essa viagem parecia não ter fim, a jardineira precisava parar sempre para o povo ir ao mato fazer as necessidades e as mulheres vomitar... Foi assim até chegar a noite no Santo Antonio do Rio Abaixo. A cidade era pequena, povo hospitaleiro, lá moravam muitos parentes que a muito não se viam, lá só tinha uma pequena pensão, muito simples, os donos se desmanchavam em amabilidades, cada dia éramos convidados para almoçar em casa de parente para conhecer, as comidas feitas com muito capricho.
Sebastião tinha uma irmã que morava lá, ela tinha um filho já moço, tinha visto o tio quando pequeno, quando me viu ficou de olhos brilhando, eu era tão jovem quanto ele, Sebastião, cortou logo, me disse para não dar muita prosa... Tinha ciúmes de tudo e de todos... Imagino que ficamos neste lugar uma semana, seguimos depois para Ferros, cidade que ele também tinha parentes que não se viam há muito tempo.
Tudo era muito diferente do que conhecia, os costumes, lá fui conhecer a canjiquinha, que comiam no lugar do arroz, a folha de samambaia, a taioba... Etc. Em Ferros foi pouco tempo, o ponto final seria Borba Gato, fazenda do tio rico com fama de mão de vaca. Família grande, muitos filhos, uma prima já teria tido uma queda por ele, antes de ter ido embora para guerra, tinha ficado alguma coisa em suspense, parece que havia alguma esperança, agora ele volta casado com uma menina... Ela continuava solteira, o pai bastante severo, não deixava as moças namorarem, ninguém servia... Havia três solteiras, os rapazes eram um casado, o resto também sem namoradas.
A fazenda era linda, tudo muito bem cuidado, também não tinham empregados, a família que cuidava de tudo, levantavam muito cedo para tirar o leite, fazer queijos, tratar dos porcos, o dia era de muito trabalho. As moças cuidavam da casa das roupas da cozinha, panelas grandes, comidas boas.
Era fazenda de café, com vastos pastos, no cafezal a terra era escura, parecia um côco ralado com chocolates, a casa ficava no alto, assoalhos de taboas largas, com varanda em volta, debaixo da casa era seleiro onde ficavam os cavalos prontos para sair a qualquer hora e os que poderiam chegar ficavam ali recolhidos. Na porta da cozinha tinha uma nascente com uma bica que jorrava água sem parar dia e noite, água pura e gelada, ali formava-se um rêgo que cortava o quintal e seguia para as lavouras, ainda perto da casa tinha uma casinha construída sobre o rêgo, o assoalho tinha um buraco onde as pessoas faziam suas necessidades, os banhos eram tomados na bacia com águas aquecidas no fogão.
Nas noites de lua assentavam na varanda pra conversar e contar causos, moças e rapazes não tinham nenhuma vivencia, não tinham um radio uma revista... Nada para distrair somente serviço. A ex do meu marido, moça já nos seus trinta anos vivia deprimida talvez tivesse alguma esperança... As vezes eu surpreendia os dois conversando baixinho, quando eu aproximava eles disfarçavam, eu fazia de conta que não tinha notado, pra não ficar clima ruim.
Nunca fui ciumenta, sempre resolvi tudo sem perder a esportiva, levava na brincadeira. Quero contar essa lua de mel com todos os detalhes, talvez venha a ficar cansativo... São muitas passagens engraçadas durante esse casamento que durou cinquenta e seis anos aos trancos e barrancos, vou me revestir de coragem para colocar tudo isso na história.
As vezes vão pensar que estou aumentando, mas aconteceu realmente... Uma noite, Sebastião Comeu muito e ainda tomou um copo de leite com muita nata, ele amava tomar leite com sal e natas... Lá tinha dois cães, que durante o dia, eram amigos, mas a noite viravam feras e ficavam soltos no quintal e ninguém chegava. Lá pelas tantas... ele sentiu dor na barriga e tinha urgência para ir ao banheiro, mas como? Era longe... E passar pelo quintal!!! Ele pensou... Não querendo me acordar levantou devagar, abriu a porta da cozinha sem fazer barulho, e não dava pra esperar muito, foi chegando atrás do pé de café e descendo a calça, de repente... Os cachorros rosnam e vem com tudo... Ele apavora corre com a calça nas pernas e pula na grade da varanda, e os cachorros pega não pega... Ele pendurado, todos acordam saem correndo, o tio pensou que fossem bandidos e já busca a carabina, eu dei falta dele na cama e corri também, e ouvi gritar: “Sou euuuu...” “Socorro segura os cachorros”, o tio gritou, as mulheres vão pra lá... Ele tá sem a calça, nestas alturas os cachorros já tinham puxado a calça dele e rasgado... Os primos e o tio ajudaram a sair da grade. E o levaram para tomar banho, e na água fria da bica. No dia seguinte para ele só servia ir embora... Todos pediam para ficar mais, eu estava até gostando mas ele se sentiu envergonhado e fomos embora.
Depois de certo tempo voltamos lá, e sempre que lembrávamos dos cachorros era motivo para muitos risos.

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