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domingo, 18 de março de 2012

Uma praia...


Continuando Belo horizonte, não tínhamos telefones, nos comunicávamos pelas cartas, que precisavam ser entregues no correio que ficava no centro da cidade, ou então ir até a telefônica e pedir uma ligação. O Sebastião, estava em experiência não adiantava ter pressa para mudar e não sabíamos o que nos esperava, era simplesmente esperar... Seja o que Deus quiser... A vida de buscar água na casa da d. Barbina, que tinha uma cisterna, e a essas alturas, já andava de cara ruim porque a água já estava faltando até para ela, às vezes saia barrenta, sinal de pouca água, era distante uns cinco quarteirões da nossa casa, mesmo assim d. Barbina nunca negou, sabia que tínhamos crianças.
Um dia chega uma carta, depois de longo tempo de silêncio, avisando que eu fosse providenciando vender nossas coisas e embalando o filtro fiel, a máquina de costuras, a radiola, as louças, enceradeira e as roupas, a firma tinha dado para ele uns dias para fazer a mudança. Iríamos ficar no mesmo hotel até conseguir alugar um apartamento.
Fiquei agoniada, como ia vender as mobílias, como por preços em tudo aquilo!... Dei um jeito de me comunicar com papai, certamente ele ajudaria a resolver o problema, e deu certo ele veio a BH e comprou os moveis. Eram bons tudo de peroba maciça, arranjou um caminhão que levou para Curvelo.
Ajudou-me a embalar o restante, eram poucas coisas, mas faltava o pior, ainda não havia parado para pensar que naquele momento eu estava me separando para bem longe de minha família, parecia o fim do mundo. E agora? Aquela turma que agente ama, aquela turma que cresceu junto, fazendo todas aquelas estripulias... Ah! Parecia cortar o coração... Em certos momentos, não sabemos expressar nossos sentimentos, não somos carinhosos, nos falta coragem para fazer um gesto, um aconchego, nosso amor é em silêncio, mas se qualquer um se sentir ofendido... É como mexer em casa de marimbondos, todos reagem e tomam as dores, se um estiver namorando todos namoram e tomam parte em tudo.
Grávidas! As sete compartilhavam. Viver com alegria é muito bom, quando estamos doentes, porque não se pode escapar disso, a união nos fortalece. Pense num lugar estranho com duas crianças pequenas, tudo era estranho, os costumes, os sotaques... Não estava preparada!
Mas quando estamos preparados para o desconhecido? Nunca! Nos pega sempre no imediato, no susto, no desprevenido. Chegou então o dia previsto, primeira vez que andaria de avião, assim aconteceu era véspera do natal.
No caminho do aeroporto, me deparei com o mar, nunca tinha visto tanta água junta, aquela imensidão! Parecia sonho, até chegar ao hotel, foi uma longa viagem. Sandra, nessa ocasião, estava com três anos e Selma, com um. Eram crianças lindas, bem cuidadas e saudáveis.
O pai delas queria mostrar aos amigos suas crias, ambas assustadas, eram muitas pessoas querendo nos conhecer, o baiano é muito agradável e receptível fácil de entrosar. No começo, estranhamos a comida, as meninas, ficaram com diarreia logo nos primeiros dias. Da janela do nosso apartamento, via-se uma praia, pequena, onde as ondas batiam com força, quando as marés estavam altas, mas quando baixavam era uma beleza...
Às vezes íamos até lá para catar conchinhas e nos divertir. O soares, como era tratado, já tinha feito muitas amizades e foi apresentando-me os amigos... Aqueles que como ele era hospede mensalista, geralmente funcionário de alguma empresa, sendo assim conheci a noiva de um, tornei-me grande amiga, era ligada a mim como uma irmã, saia conosco, mostrava tudo, nos levava as praias, eram finais de semana inesquecíveis.
Conversa vai, conversa vem, ficou fácil deduzir onde o Soares gastava o dinheiro que estava recebendo, nunca sobrava para mandar para mim em BH, sempre apertado, não dava... Agora sabia com certeza, que gastava na boate, pagando uísques caros para as amigas e jogando cartas a valer.
Eu sempre tive pavor de jogos de azar, o pai dele perdeu tudo que tinha com jogos e eu sabia disso, minha sogra me contava e me alertava, dizia que o jogo é o vicio mais terrível para destruir um lar. Passei a observar, Tirava minhas conclusões, Lembrei-me da loteria. Deve ter nadado de braçadas naquela época, eu era muito boba, não tinha maldades, não tinha malícias, ele teria muita facilidade para me passar para trás, eu nunca havia pedido explicação de nada.
Minha amiga terminou o noivado, descobriu que o noivo também estava jogando, ficou triste, era apaixonada por esse noivo, mas não teve outra opção. Ficou minha amiga para sempre. Conheci também no hotel um casal que chegou, tinha um filho, o marido foi para procurar emprego, as crianças logo se aproximaram e naturalmente as mães ficaram também companheiras de prosa, íamos para o jardim do hotel e ficávamos ali por um bom tempo conversando e olhando os filhos.
Gerusa que era seu nome tinha uma máquina de costura portátil, a minha como estava embalada esperando mudar para um apartamento o parecia que nunca ia acontecer.
Resolvemos fazer roupas para as crianças eu sabia, ela também um pouco. O sistema era o mesmo de costume, desmanchar umas para fazer outras. Soares vendo a situação do marido da Gerusa arranjou no laboratório para ele viajar como vendedor, o mesmo já tinha algumas experiências de vendas, fez as primeiras viagens com ele para treinar, parecia que tudo iria dar certo.
Nisto, conseguimos um bom apartamento próximo ao hotel e a pequena praia do Inhão na Praça Inocêncio Galvão onde era possível levar todas as manhãs as crianças para brincar. Nesta praça havia feira todos os dias pela manhã. Tinha também o passeio publico do palácio, onde era permitido entrar.
Não tínhamos TV, as novelas só podíamos ouvir pelo rádio, e sofríamos com os dramas. A tarde ia até a Praça da Piedade para as crianças brincarem com as outras que ficavam ali brincando de rodas. Aos domingos a missa na igreja da Piedade ou de São Francisco.
Demorava em ter noticiam dos pais e irmãos, as saudades eram muitas, era impossível esquecer toda aquela história, tão cheia de altos e baixos, esse é um dos motivos pelos quais escrevo. Esvaziar um pouco minha mente, não quero levar toda essa riqueza para o tumulo, não espero recompensa, quero estar bem comigo mesma, tenho urgência, o tempo não espera, a memória já me falha...

Um comentário:

  1. Olá Zélia!
    Que bom visitar o seu blog!
    Uma delícia as suas histórias e que vontade de a ouvir pessoalmente a contá-las!
    Cada vez que as leio imagino-me sentada, numa varanda qualquer, a olhar uma paisagem linda e a Zélia a meu lado, a contar, detalhadamente, a sua Prosa Mineira.
    Parabéns pelos textos!
    beijinhos da Amiga Isamar (Isabel)

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