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domingo, 4 de março de 2012

Belo Horizonte


O marido alugou uma boa casa em frente os pais dele, pensou que estando sempre viajando eu não ficaria muito sozinha.
Chegamos à tarde, viemos de jardineira, minha mãe veio comigo, deixando para trás meus irmãos, até o Marcio que ainda amamentava, mãe é assim, não desampara o filho que mais está precisando... Naquele momento, era eu.
Não podia imaginar o que me esperava, pra começar o bairro não tinha água, a casa tinha a caixa d’água vazia, me disseram os vizinhos que a água costumava chegar as 23horas até às 04 da manhã, quem quisesse pegar e encher os baldes teria que ficar acordado, a água vinha pouca e sem forças para subir na caixa. À tarde chegou o caminhão com a mudança, os móveis desmontados, e as coisas da criança que eu esperava, estavam dentro das caixas junto com outras roupas; começamos a montar tudo, colocar nos lugares.  Eu estava muito cansada, sentia dores por todo lado, muito suada, era necessário um banho. Minha mãe começou a buscar baldes de água nos vizinhos, jogar na banheira para eu tomar um banho e descansar um pouco, de repente as dores começaram, estava entrando em trabalho de parto, era preciso arranjar um taxi rápido, ajuntar as roupas da criança e correr até ao hospital S José.
Foi um calvário, contrações, Solavancos, ansiedades, medos, tudo junto, minha sorte é que a empresa em que o marido trabalhava tinha um bom convênio, e pude ter um bom atendimento. Nasceu Selma, era muito pequena, e gostava de fazer caretas, o engraçado é que quando chegavam visitas ela podia estar dormindo que acordava, e começava a sessão de caretas. Quando completou três meses, ela se tornou uma criança linda, mansa, alegre e sadia, nem parecia a mesma.
O problema da água continuava, a mãe foi embora, as crianças dela precisavam de cuidados, eu ficava as madrugadas aparando água na torneira da rua onde a parte era mais baixa e a água chegava primeiro. O Soares, saia cedo e voltava à noite, eu ficava com as duas filhas e fazia tudo em casa, não tinha fogão fazia comidas no fogareiro a álcool, como já disse anteriormente, o marido e família tinham medo de fogão a gás, imagina sem água e sem fogo! Não era de achar graça... Só quem nunca passou por isso, para não saber o que é; duas filhas usando fraldas de tecidos para dar banhos, fazer mamadeiras etc.
Coloquem-se em meu lugar! Fiquei mais de um ano naquela casa, daquele jeito... Como agora ele estava trabalhando, achou por bem comprar uma maquina de costura a prestação e deu-me de presente. Às vezes pegava meus vestidos, aqueles que não estava usando e desmanchava, fazia vestidos para Sandra, para que as vizinhas que tinham meninas da idade dela fizessem algumas encomendas... Só que não rendia, o tempo era pouco, mais saia alguma coisa e eu ficava feliz de ver que conseguia ter um pouco de dinheiro meu ... Do meu trabalho, não importa quanto... As dificuldades não param ai... As meninas adoeciam muito igual a qualquer criança antes de quatro anos, era garganta inflamada... Alergia, febre quase todas as noites, eu era inexperiente, faltava o conhecimento da minha mãe! A sogra era bondosa, me ajudava no que fosse possível, mas eu evitava ocupa-la, ela era bem idosa, e fazia também o trabalho da casa e cuidava do meu sogro que tinha dificuldades para andar, pegava água a noite, como eu, às vezes enchia também meus baldes para me poupar o tempo.
As cunhadas já falei que eram duas e trabalhavam fora, não podia contar com elas, e tinha aquele menino, o Antonio! Lembram-se? Ainda precisava de cuidados foi sempre muito doente e mimado... Era o preferido em tudo... Isso me tirava a liberdade de exigir alguma coisa. Ela já estava no limite... Não dava mais.
Arranjei uma menina em Curvelo, para me fazer companhia, era muito boazinha com as crianças e me ajudava em tudo, sobrava mais tempo para me dedicar às costuras que por acaso aparecessem.
Nicinha estava noiva do Helio, depois do casamento iria morar em Belo Horizonte não me foi possível ajuda-la em nada, o dinheiro curto de ambos os lados. Ficava pensando... Minha primeira irmã está para casar e não estou compartilhando com ela esse momento tão importante pra ela; sabia bem o que era arranjar tudo para um casamento, parece que acumula as coisas, o tempo passa muito depressa Sebastião tinha um irmão que estava em Recife como gerente deste mesmo laboratório farmacêutico em que ele trabalhava, não falei nos irmãos dele que eram sete ao todo, haviam trazido os pais para a capital e os mantinham.
Como o marido sempre foi bom vendedor cobria todas as cotas, não demorou a ser promovido, sendo convidado a ir para Salvador, queriam abrir uma filial naquela cidade; aceitou rápido, era tudo que queria, porém tínhamos que morar naquela cidade ele se sentiu realizado, sempre sonhava em ser gerente, achava que seria a melhor oferta, eu também sem nenhuma experiência de nada fiquei eufórica... Depois, passei a sentir que foi a pior coisa que poderia acontecer... Ele não tinha estrutura para dirigir uma filial de uma empresa multinacional, quanto à honestidade punha a mão no fogo como dizem, era correto até demais, se prejudicava e a família por causa do trabalho.
Foi para Salvador, nos buscaria depois de um tempo de adaptação; ai sim que foi tempo difícil, chegando lá fez amigos, que trabalhavam no mesmo ramo, morava num hotel bom, de vista para praia, a firma arcava com todas as despesas dele, inclusive jantares com clientes, festas e tudo mais; em baixo do hotel tem, acho que até hoje, uma boate onde além dos bailes, também haviam jogatinas, ele me perdoe de onde estiver, e sabe bem de que estou escrevendo, já perdoei e não guardo ressentimento; prometi contar tudo... Por esse motivo toco neste assunto, poderia deixar passar...
Continuo em BH um mês, dois meses, três meses, Aniversários das meninas... Mandava dinheiro para o aluguel, a prestação da maquina de costura, água e luz. Encerrava ali, eu costurava quando tinha trabalho, comprava comidas com meu misero dinheiro, mas, como rendia!... Às vezes minhas cunhadas iam lá e faziam algumas compras, nunca pedi ao papai, nunca reclamei com minha família o que estava passando, naquele tempo ninguém tinha condição de ajudar.
No bairro da cachoeirinha, eu morava ali, onde hoje é aquela bela avenida, Mexicana, me parece que é mesmo este nome, era um brejo, muito barro, o povo fazia buracos no barro para recolher água para lavar roupas e outras coisas, águas de esgotos que eram jogadas ali, minha casa era na descida da rua Descalvado, que corta a bela avenida, quando chovia virava um rio, as enxurradas desciam como cachoeira; do outro lado subindo um pequeno morro, perto da igreja da Renascença morava o Dr. Antonio, médico bom, humano e atencioso, muitas vezes me socorreu nas madrugadas... Ah! Dr. Antonio... Se as pedras falassem... Talvez chorassem comigo. Iriam se lembrar das vezes que eu com uma filha nos braços tremula de febre, enrolada em um pano; segurava a sombrinha, e a saia, para não molhar na enxurrada, eu podia me molhar ela não, estava doente... Muito doente. Subia o morro fatigada, só Deus sabia, como estava aflita. Hoje recordando, lembrando dessas coisas vejo que o que temos que passar não vai para outra pessoa é nosso. Tudo em nossa vida passa é questão de tempo... O que é bom passa rápido, o ruim demora uma eternidade... E, também vai... Muitas vezes questionamos, “porque comigo?” Só ELE sabe, aquele que criou todas as coisas e continua a criar, ELE, quer nossa aceitação.

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