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sexta-feira, 24 de junho de 2011

Festas Gerais


O ano já está na metade, e a preocupação aumenta. As crianças que estão no terceiro ano têm que tomar um rumo, os pais que tem condição mandam os filhos para Curvelo ou para por ai. Maria Luiza, nossa professora era mesmo sem igual, ensinava de tudo: bordados, tricô, crochê, religião. Essa é com a vó junto e a bíblia pra não ter falha. Estávamos nos preparando para fazer a primeira comunhão, era muita responsabilidade... Veja só o tamanho dos pecados... Ela tinha que fazer um grande trabalho nas cabeças daquela turma. Deveríamos ser uns trinta, meninos e meninas. O padre já tinha posto na agenda, que em novembro iria lá fazer as celebrações, os batizados mais ou menos uns vinte, os casamentos, as confissões e os aconselhamentos porque tinha muita gente de mal sem se falar, era preciso urgente não podia continuar... Trabalhavam juntos como ficavam assim, tinha que dar um jeito, só o vigário saberia resolver essa situação.
Antes o mesmo teria que ir celebrar no Gerais, na fazenda do tio Ramiro, lá é a mesma coisa tudo igual, casamentos... Etc. Papai novamente... Arrumar o carro de boi com toldo pra proteger do sol muitas comidas, biscoitos, cafés, chás. Tinha uma serra grande, a meninada, nós e algumas comadres com a turma delas era uma farra. O carro precisava cantar, a gente morria de achar bom, então passava no eixo azeite com carvão moído, aquilo esquentava na subida e começava cantar, de longe se ouvia, o cheiro da mistura enjoava as mulheres e alí era só vômitos, na certa estavam grávidas de novo... Minha mãe também, só pensavam nisso!...
Chegando no tio Ramiro já ao entardecer, era só tirar tudo do carro soltar os bois pra descansar e comprimentos, Alegrias, Risos. As comadres que ha muito tempo não se encontravam, as fofocas atrasadas, até por em dia demorava, entrava pra noite, ninguém dormia, conversava a noite toda. O padre também entrava nessa. Ficava sabendo de tudo que se passava na região, era fácil pra ele fazer o sermão já conhecia onde estavam as falhas, no dia seguinte depois da missa muitos ficavam comovidos e pediam perdão. Ai vinha a comilança: pernil assado, mandioca da boa bem cosida, frango ensopado com quiabo, tutu de feijão com molho de cebola, só delicia. E o torresmo? Não podia faltar, era prato de primeira.
Continuava com as sobremesas, doces de frutas, latas cheias de mamão aos pedaços, de aboboras amarelas, laranjas da terra, toranjas!... Nunca mais comi... Parece que estou sonhando... Acorda Zélia! Modo de dizer nunca mais comi feito daquela maneira. Até me emociono... À volta, o assunto não tinha fim..., “A comadre fulana, achei que ela tava muito gorda! Cê não achou?” “Há é verdade achei...” Eu corria com as colegas todo o tempo, colhendo flores no caminho, pedrinhas Santana aquelas quadradinhas que só vi naquela região. Sapatos? Cadê... Pendurados nos fueiros do carro, os pés só poeiras, quando chegar em casa dá-se um jeito.
Não falei nos casamentos nem batizados, foram sempre iguais aos já comentados. Já estava aproximando as festas juninas, essas eram especiais, agora é pra usar os cavalos... Isso era comigo mesmo já tinha o meu, Nicinha também, Armando ia na garupa da mula com o pai. Ana Maria, na garupa do cavalo da mãe, aquele bem manso acostumado a carregar mulher grávida. Ela ia de silião, aquela cela que anda assentada só pra mulheres, tem todo um ritual. Era o dia inteiro de cavalgada, levava todas as matulas necessárias para uma viagem era só felicidade... Não via a hora de chegar, encontrar as primas meus avós as tias era maravilhoso... Ummm...sentia já o cheiro dos geromões, dos queijões, e ajudar em tudo, buscar argila no riacho para passar na fornalha e ficar branquinha, ir junto com as pessoas que buscavam lenhas no serrado para cozinhar e fazer a fogueira, faziam os feixes e com uma rodia na cabeça colocava o feixe. À noite lua cheia, céu estrelado e muito frio, acendiam aquela fogueira enorme... Parecia uma torre, minha vó fazia o altar com toalhas de rendas brancas flores e velas, pedia silêncio buscava os terços, faziam todos oferecimentos e agradecimentos e puxava a oração. O santo do dia era preso na ponta de uma vara e levantado para ser homenageado. Ai soltam-se os fogos e começa a reza, as crianças ficavam impacientes, precisavam ficar quietas e a reza não tinha fim... Quando terminava as menores já estavam dormindo.
Começava o forró e quentão à vontade, canjicada não faltava e bem saborosa bastante amendoim, a semana anterior foi toda de preparativos: socar milho pra virar canjicas, selecionar folhas e condimentos para o quentão, todos eram muito alegres, e varavam a noite. Depois de uns dois dias voltávamos pra nossa casa e prosseguir nas lidas. Não posso agora deixar de dar a posição do carneiro de meu irmão Armando. Quando viajávamos o bicho não pastava fazia greve de fome também, só andava atrás do dono o dia inteiro, era o menino de camisolão e um carneiro seguindo. Não havia jeito pra separar os dois, se ia dormir o bicho deitava na porta do quarto, mamãe dizia: “E agora que vamos fazer com isto?” Papai falava: “Deixa Maria... Quando Armando crescer e for pra cidade esse amor acaba, tenha paciência é assim mesmo o menino é pequeno!” Mas... E o tanto de cocô junto! Aja paciência... E ficava berrando até acordar o garoto. Tirávamos proveito nisso, quando Armando mexia em nossos brinquedos, a gente dizia que ia sumir com o carneiro então ele parava e ficava bonzinho só assim pra ter sossego.

Vocês nem imaginam quantas coisas de ruim tinha naquele tempo, sempre havia alguém com furúnculo nas nádegas, ou debaixo dos braços, aquilo doía e dava febre era terrível. Às vezes precisava espremer até sair toda secreção. Diziam que se não tirasse tudo voltava depois. Tirava na marra com gritos e tudo que tinha direito. Dava também tal de panariz no dedo de mulheres que inflamava ficava vermelho e muita dor, esse era preciso levar ao medico em Curvelo. Tinha um porém, ia pra consultar o dedo e toda vez tinha que tirar as roupas. Elas diziam: “A doença e no dedo doutor!” “Eu sei, mas tire a roupas, por favor!” Ele não fazia nada, mas tinha que tirar as roupas. Só as moças. O nome dele me ficou na memória mais deixa pra lá. Era medico dos pobres só pagava quem podia, ficou famoso por isso era ateu mais caridoso.

2 comentários:

  1. D.Zélia, que história!! Sabe que me chamou a atenção que a senhora diz que as crianças estão no 3º ano e tem que tomar um rumo, fiquei a pensar porque minha mãe diz que na época dela só tinha até o 4º ano, que foi até onde ela estudou, ela é muito inteligente e escreve muito bem. Só que ela não tem paciência para digitar, aliás ela nem conhece computador, acho que eu teria que sentar ao lado dela e pedir para ela ir falando tudo que lembra e eu vou separando as histórias, porque se ela for como eu vai começar falando uma coisa e depois já vai estar em outra.rss
    A senhora falando de canjica, quentão neste friozinho, hummmm, delícia, e uma pergunta:_
    Naquela época não tinha o "pau de sebo"??
    Vou parando aqui... gostei de conhecer sua história, muitas alegrias e algumas tristezas também né, mas faz parte da vida!!
    E esse médico danado, hein? Além de pagar tinha que tirar as roupas, ateu até concordo, mas caridoso... rss
    Beijos

    Margareth

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  2. D.Zélia,

    Agora o que venho a falar não tem nada a ver com esta postagem e sim com a iniciativa da senhora. Talvez seus filhos, netos... não tenham idéia da HERANÇA que está deixando(sua história), o que está fazendo vale mais que todo dinheiro do mundo.
    Meu conselho: Imprima todas as postagens, e com elas vai ter seu livro.
    Sei que a internet está cada vez mais confiável, mas além de estar usando de precaução, vai incentivar ainda mais a leitura.

    Parabéns mais uma vez, fica com Deus!!

    Beijos

    Margareth

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