Total de visualizações de página

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Assombração


Como recebi do meu irmão Armando, suas anotações, que como já disse tencionava escrever as histórias do Soares. Depois que este ficou doente, Armando perdeu a graça, não mais tocou no assunto. Visto ter começado a escrever, ele me enviou algumas histórias, lembranças, e agora passo a relatá-los, não em seguida para não se tornar cansativo... Mas devagar, irei relatando. No jeito dele, como ele se expressava seus dizeres e modos.
Nossa casa em Curvelo dividia o quintal com o pai, nasceu ali junto ao muro uma goiabeira que passava os galhos para nosso lado, bem em frente à janela do nosso quarto, sendo assim a garotada traçou toda a estratégica... Naquela época, os ternos em sua maioria eram confeccionados por alfaiates sob encomenda, faziam-se várias provas durante a confecção. O nosso alfaiate chamava-se SADY, baixo gordo e sempre sorridente, feliz com a vida. Sem problemas visíveis, querido por todos.
Pessoa simpática, ele usava manequins de papelão para deixar as roupas em exposição até o freguês vir buscá-las. Não sei como, foi parar em nossa casa uma daquelas preciosidades, foi um achado, serviria para muitas coisas... A imaginação voava solta! A é mesmo, Papai gostava de fazer assombrações para nós e os empregados, era preciso andar atento para não cair na dele.
O Soares era a valentia em pessoa, arrastava aquele papo de que "faço uma, dou uma surra, dou um tiro no pé, vocês não brincam comigo... Esperem pra vê!" Uma noite, pai pensou... Chamou a turma e combinou como seria fazer assombração para o Soares, não podia ficar por perto, era perigoso, ele poderia atirar e ferir alguém. Papai pensou em tudo... E chegou a conclusão, "vou vestir um manequim com uma roupa do Soares, colocar em cima da goiabeira, amarrar com uma corda e balançar quando ele já estiver deitado, vai ser tarde da noite!"
Na janela do nosso quarto, tinha uma tela fina para evitar entrada de pernilongos que eram frequentes, de lá ele poderia ver a pessoa com a roupa dele e na certa pensaria em um ladrão! Assim foi feito tudo com detalhes minuciosos para não deixar nenhuma dúvida. Ficamos até tarde assentados na porta da rua, conversando, rindo e contando piadas, para dar tempo de montar o projeto da assombração, todos esperavam o momento ansiosos.
Minha mãe serviu o leite para o Soares para evitar ele ir a nossa cozinha para não ver as armações. Fomos dormir sem pensar que alguma coisa poderia vir a acontecer. Aquela noite prometia, Não foram deitar esperando o desenrolar dos acontecimentos. Já era tarde, quando o Soares levanta para ir ao banheiro, deparou com a coisa, Mexeram com a corda, Ele se assustou, olhou e viu, o homem na goiabeira, voltou rápido e me chamou assustado, "Fizinha tem um ladrão no quintal, vou levar o revolver e dar um tiro nele, você fica tranquila, mas minhas roupas ele não vai levar."
Pegou na gaveta do criado o revolver, conferiu as balas e não tinha deixa disto, puxaram a corda e o sujeito caiu na hora do tiro. Ele saiu e foi chamar o meu pai, queria saber o que fazer... Papai como já estava esperando por isso, disse logo, "vou te esconder na casa da mamãe, você vai ter que fugir do flagrante!” A cadeia ficava na praça onde minha vó morava, como ele poderia passar por ali? Papai achou por bem falar pra ele fazer um disfarce, colocar uma roupa bem velha, um chapéu de aba grande para esconder a cara e uma botina velha, era para ninguém reconhecê-lo.
Assim foi feito, depois achou que não estava bom, então papai teve a idéia... "Vai precisar se esconder aqui mesmo, vamos arranjar uma mesa e colocar uma cadeira em cima e você sobe e entra no alçapão, ai vai ficar melhor, podemos cuidar de você, dar comida e tudo mais que precisar." Ele concordou imediatamente, estava ansioso, segurar o riso era o mais difícil. A preocupação era tanta que nem se lembrava do corpo estirado no chão.
Papai por fim, ficou com pena. E agora para desfazer toda aquela brincadeira? O Soares ia virar uma fera! “Vai ter que ir com jeito...” “Antes de subir ao forro da casa...” Nestas alturas, já era de madrugada, mas ninguém tinha sono, a meninada esperava o desenrolar dos acontecimentos... Por fim papai foi com calma, “Olha Sebastião nós gostamos muito de você, por isso tivemos a liberdade de fazer essa brincadeira, só pra ver se você é valente mesmo, você desculpa... Isso não voltara a acontecer." Ele ficou com sorriso amarelo e depois foi também rir da situação... Disse, “Vocês vão me pagar caro!” recordávamos, ríamos juntos, ele dizia, "vocês são bobos demais" Soares, rimos porque te amamos você sabe quanto... seus causos ficarão gravados em nossas memórias. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário