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domingo, 9 de outubro de 2011

As viagens


Como agora só andávamos em turmas, as meninas para um lado, meninos para outro. Muitos já com os hormônios fluindo, as paquerinhas começando, as distrações, quando não íamos para o retiro no final de semana, era passear no jardim, como já contei, ou ficar na porta do cinema vendo quem estava entrando, ou indo a missa das dez, na praça da matriz. Minha tia caçula, depois da morte do vô Domingos, não voltou pra Belo Horizonte. Ficou com vó Ezequiela, as outras irmãs já tinham se casado e estavam em suas casas. Nadir foi morar em BH, isso era motivo para sempre irmos passar ums dias lá. Minha tia mocinha como eu, a diferença de idade era só de três anos e muito amigas, foi uma amizade que permaneceu por toda vida. As viagens pra BH, merecem ser contadas. As estradas não eram pavimentadas, quando chovia, o barro fazia atolar os carros, a jardineira entào. Essa coitada, era preciso o trocador decer, ir ao fazendeiro mais próximo, pedir duas juntas de bois pra puxar e tirar do atoleiro.
Quando passava no bananal, que nào tinha nada de bananas, era um pequeno riacho, ai a coisa era feia, os passageiros desciam, as moças, geralmente de sapatos novos e vestidos brancos de lese, isso tudo pra ir para capital. Às vezes era preciso juntar todos os passageiros para empurrar a jardineira. Chegávamos em BH todos emlameados. No tempo da seca era pior, a jardineira era sempre velha, com o fundo furado, então entrava terra por todos os lados, não se podia fechar o vidro que estava sempre emperrado, e mesmo assim as mulheres ficavam enjoando, e vomitando. Misturava aquela sujeira, junto com tudo que já tinha na jardineira velha.
As malas como já disse em outra história, iam em cima amarradas, lá tambem iam bandas de porcos, galinhas, sacos com mandiocas etc. Isso é o que me lembro, devia ter muito mais coisas. Nossos cabelos e cílios ficavam amarelos e a gente cuspia barro. Havia tambem o trem, o noturno, ele passava sempre as vinte e duas horas, chegava em BH quando não atrasava muito, pela manhã, era melhor porque ficávamos livres do barro e da poeira mas em compensação não se podia dormir e tambem, se chovesse, era preciso abrir o guarda chuva, e tínhamos que usar um jaleco, ou melhor, um guarda pó, como era chamado, para protejer as roupas das faiscas de fogo, que saiam das chaminés da Maria Fumaça. Áh!... Mas quando chegava em BH, era uma beleza, passear de bondes. Ficávamos dando voltas, os rapazes eram diferentes, bem desinibidos, chegavam e puxavam logo conversa.
A noite passear na avenida Afonso Pena, as duas de braços dados, era moda. Os moços ficavam também encostados nos postes de luz olhando as moças. Durante o dia ia para o parque Municipal, tinham fotógrafos espalhados no parque e nas avenidas, bastava passar  por perto pra ser fotografada e recebia os retratos na volta. Parece que eles conheciam com certeza quem era do interior para atacar. Nós dávamos boas risadas, era muito divertido. Iamos na rádio Inconfidência assistir programas de calouros, ver Emilhinha Borba, Orlando Silva, Nelson Gonçalves e a cantora Marlene. Todo os dias tinha um programa diferente.
Não demorou pra minha tia arrumar um casamento, esse caso não presenciei, fiquei sabendo por ela mesmo. Conheceu o moço, gente boa... Enamorou-se, ficou apaixonada, ficou noiva e voltou para casa em Curvelo para fazer o enxoval. O noivo era gente de posse, como ela também. Era pra ser grande acotecimento... Igreja de S. José reservada, bufet contratado, tudo certo... Ela foi com minha vó para um hotel pra sair de lá já pronta, mas não é de ver, que na noite anterior ao casamento, já lá pelas vinte e duas horas, ela disse a minha vó: "mãe eu vou embora, não quero mais me casar." A vó disse: "Maria, você está louca, não pode fazer isso!"  Ela disse: "Se você quizer ficar ai fica, que eu estou indo, vou pegar o noturno para casa de minha amiga em Piui." E foi saindo, já com as malas, minha vó falou: "Não vou passar essa vergonha sozinha, vou tambem..." Juntou as coisas dela e foi junto no trem noturno.
Não fiquei sabendo do desenrrolar dos dias, nem ela quis saber. Posso imaginar que foi muito desagradavel tudo isso. Não demorou pra ela conhecer outra pessoa, e se casar direitinho, o casamento foi na fazenda do Rio do Peixe, não fui ao casamento. Não me lembro o motivo...Talvez a história seguinte possa explicar.

Um comentário:

  1. ...uai...ja tava sentindo falta de suas estórias. Lendo, eu consigo imaginar direitinho as cenas como em um filme, ainda mais que conheço os protagonistas e os locais dos acontecimentos... Parabéns! Vc continua arrasaaaando!!! Bjus

    Lúcia

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