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terça-feira, 24 de maio de 2011

Toá


 

Sempre que precisava ir a Curvelo, para levar as crianças ao médico e ao dentista, tinha que ir de caminhão que levava as latas de cremes para a fábrica de manteiga. Toda semana o caminhão passava numa estrada longe da fazenda em um lugar chamado Toá, então arrumava a comitiva no carro de boi, tudo de novo, chegando na encruzilhada depois de um dia inteiro de viagem com solavancos e baques por causa de tantos buracos na estrada, o caminhão sempre atrasava ele recolhia cremes em diversas fazendas, dava tempo até de fazer comidas e dormir um pouco. Sempre saíamos de madrugada, mamãe estava novamente grávida, o caminhão chegava já vinha cheio de gente na carroceria em cima das latas forradas com lonas e sacos com tudo que podem imaginar...: Mandiocas, Batatas, Farinha, abóbora e muito mais. E até galinhas e porco morto. Minhas tias, irmãs do pai já moravam em Curvelo, muitas já tinha casado outras não, eu lembro que não fui aos casamentos das mesmas, era muito difícil para minha mãe sair de casa e levar aquela meninada. Meu vô Domingos tinha muitas casas lá na praça do santuário, alugava algumas, e deixou a da esquina para eles quando fosse à cidade, então hospedávamos lá. Todo ano tinha festa de São Geraldo o santo padroeiro, vem pessoas de muitos lugares que fazem promessas. É uma semana de barraquinhas, muitas comidas boas, arrastas pés e forrós, tinha também jogos de pescaria e parques de diversões, para nós era o que tinha de bom, todos ganhavam roupas novas sapatos quase sempre apertados, os pés não eram acostumados a calçar. Voltávamos pra fazenda no mesmo caminhão na semana seguinte do mesmo jeito que veio só que as latas agora voltavam vazias, tinham sido trocadas pelas cheias. O carro de boi vinha pegar o pessoal no Toá, o caminho de volta era terrível, sempre à noite e com os buracos a sensação é que ia tombar, a qualquer momento. Mamãe ficava rezando e querendo que todos a acompanhassem nas orações ela dizia que oração de criança tem mais valor, às vezes chovia, ai ficava ruim alem de ficar debaixo da lona ainda haviam as enxurradas que não deixavam ver os buracos sem contar os enjôos da gravidez. Mesmo assim estávamos felizes, no dia seguinte as visitas começavam bem cedo. Todos queriam saber logo as novidades da cidade as crianças companheiras, queriam saber como eram os brinquedos, meus pais compravam alguns nas barraquinhas para presentear os filhos dos trabalhadores eram ioiôs, apitos, trazia também busca pés para correr e rir bastante. A lida continuava, indo para o pasto procurar capim próprio para encher colchão e um capim liso e de touceiras que precisa arrancar e cortar as raízes. Os colchões antes eram cheios com palhas de milho mas logo ficavam duros tinha que ficar sempre revirando, para as crianças era divertido ver fazer as trouxas e deixar rolar morro a baixo, a gente corria atrás e acabava caindo junto, chegava em casa toda esfolada e a mãe brigava o pai protegia. Pra ele tudo podia: era vivencia. Perto de nossa casa havia um grande lago onde dava muito sanguessuga, é uma lesminha que dá na água parada e pega nos animais e até em pessoas, enquanto não se enche de sangue não solta..
La na beira tinha uma cabana de pau a pique onde morava uma velhinha cega, D. Seviana, mamãe levava alimentos para ela, pegava água na bica e enchia o pote ficávamos horas lá ouvindo as historias que ela contava de rainha, princesas, eram historias lindas. A gente vivia aqueles momentos, ela dava tanta vida nos causos que ficávamos como que encantados. Não consigo imaginar como D Siviana sobrevivia ali só pela graça de DEUS mais nada.
 

3 comentários:

  1. Zelia, aiii que nostalgia total que me deu agora. Criança adora uma história e eu num era diferente :) Sua mãe batalhou bastante né?! Eu digo que mãe é sempre guerreira, já trazem isso intrínseco!
    bjo grande pra vc com carinho,
    Meire.

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  2. Zelia. Quanta pureza em suas palavras! Me encantei. É lindo! Parabéns.

    Beijos

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  3. Maezinha finalmente hoje tirei um tempinho para viajar nas suas histórias maravilhosas...ahhh a festa de São Geraldo está em minha lembrança..maçã do amor lembra ??? Saudades de tdo isso mãe..Te amo beijos

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