Não está sendo fácil para coordenar minhas ideias, às vezes penso uma coisa e escrevo outra, acredito que com a idade avançando não se pode esperar grandes realizações... Tento fazer o melhor, mas ao mesmo tempo aceito a incapacidade, encaro com tranquilidade as limitações. O que quero deixar são nossas histórias, o que vivemos durante esse tempo... Hoje, vou continuar com meus pais e irmãos, como já disse, estavam quase todos morando em BH, menos um irmão, Marcio e um sobrinho filho de José Carlos, o Fabrício. Esses continuam em Curvelo.
Visto a isso, o papai foi perdendo o interesse pelo retiro, também depois daquele dia que marcou nossa história, O TIRO, nosso pai tornou-se um homem diferente,
Perdeu a ambição de querer crescer... Talvez seja por causa da fala, perdeu o timbre de voz, as palavras ficaram mais difíceis para serem pronunciadas, tudo isso eu entendo, porque o pai que eu conheci era dinâmico.
Como fui a primeira filha, senti a diferença, meus
irmãos mais novos não viveram meus dias, tudo que conto, alguns não entendem.
Quando chegaram o sol já tinha se posto no horizonte. Então, conclusão, acharam
melhor que ele vendesse o retiro, as casas e fosse morar em BH, minha mãe também
já não tinha a mesma saúde, vivia se queixando... E foi assim, venderam, comprou
em BH uma boa casa, na Pampulha, lugar bonito... Bem perto do estádio, podiam
andar em volta da lagoa e estava ainda sobrando algum dinheiro para viverem
bem.
Minha mãe parecia estar no céu, de tamanha felicidade, era vaidosa... Enchia a boca pra falar onde estava morando, tinha orgulho dos netos e dos filhos, nem se fala, eram os mais bonitos e bons ninguém tinha defeito.
Ah! Minha mãe Maria, volto a falar de você com muita saudade... Com um grande aperto no coração, te conheci muito tempo... Compartilhei com seus momentos de alegrias e subi contigo os calvários... Ah! Mãe, só quando nos tornamos também mães, é que sabemos... Você estava tão feliz naquela casa que você nunca tinha imaginado... Era tudo tão simples... Você agora queria uma sala bonita, igual as das vizinhas e você podia ter.
Mas tem sempre um porém... Ainda tem netos
pequenos... E muitos... Quando se reuniam, eram donos de tudo... Mesmo assim
você queria aquele painel na parede... Naquela sala, aquele tapete de arraiolo
que Ângela fez!... E os jogos de lingerie, que ganhava de presente, esses eram
para desfilar na passarela do quarto para a cozinha, passar na copa onde a família
estava conversando, e receber os elogios, agora sei por que você não levava a água
para o quarto... Vaidosa, você era muito linda!
O capricho com a espera de nossa chegada estava
sempre assentada junto com o pai no degrau da escada, seriam os primeiros a nos
receber, e o pai pegar as malas. O café já pronto, e as quitandas feitas na véspera,
as camas já arrumadas com tudo combinando, esse era seu jeito.
Mas, Deus te fez esse agrado porque sabia o que
já a esperava... Seu prazer foi curto... Depois de um tempo, não sei com
precisão quanto, ela foi ficando doente, e vieram as visitas aos médicos,
exames e mais exames, e dores, e cansaços.
Após muitas consultas constataram o câncer no intestino.
Isso significava o aviso do fim. Mesmo sendo mulher forte acostumada a tantos dissabores,
esse parecia ser maior do que sua capacidade tinha bons médicos, os melhores de
BH, tinha recursos financeiros, bom convenio, mas não tinha tempo de vida, não
adiantava ter tudo isso.
Minha filha Kenia estava noiva, o Geraldo seu noivo é de BH, e morava em Itumbiara, trabalhava na usina de Furnas, resolveram ir casar em BH, com isso ela poderia assistir ao casamento apesar de não estar bem. Os médicos prepararam-na para ter uma melhora, fizeram a quimioterapia uns dias antes.
O fotografo foi na casa dela fazer as fotos na
sala que tinha preparado, ela curtiu todas as poses olhando escondido para não
atrapalhar. Passado o casamento, alguns dias depois ela foi para o hospital, e
foi só sofrimento, até que a sedaram e foi o fim daquela mãe menina, mãe
mulher, mãe Maria. Ficaram seu jeito, suas
histórias, sua doçura...··.
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