Agora, vou voltar naquele assunto do sonho! Alguém
tá lembrado? Aquele que pedi para perguntar se sonho era verdade?
...Sim é isso mesmo... Minha vida estava a mil
por hora... Muito trabalho de costuras, sem ajudantes, longe de lojas de
aviamentos, longe de tudo até da cidade era mesmo o lugar que Judas perdeu as
botas. Mas feliz!... Era o que eu podia ter, nunca pensei alto, acho que cada
um recebe seu quinhão... Então continuando... Na minha comunidade só tinha
missas aos domingos, agora não podia ir às dezoito horas na catedral, o máximo
que fazia era ir ao grupo de orações as quintas feiras, depois das aulas Kelly
me apanhava para vir embora.
Às vezes levava as roupas para as clientes dar
provas, elas tinham dificuldades para encontrar meu endereço, mas tudo bem, não
demorou fizeram avenidas e facilitou o acesso ao nosso
conjunto residencial.
Um domingo participava da missa, na saída
deparei com uma moça que também participava, me dirigi a ela e perguntei se
estava morando aqui, me respondeu que sim, era logo ali perto da minha casa. Na
verdade, conhecemos as pessoas que comungam a mesma fé, as encontramos todas as
vezes que participamos de um ato litúrgico, mas essa era a primeira vez que a via,
saímos juntas como se já nos conhecêssemos, trocamos informações... Falou-me
que os pais tinham comprado uma casa aqui, disse-me que estava morando em
Recife a trabalho, tendo sido transferida para Uberlândia há poucos dias.
Uma pessoa agradável, amiga atenciosa e os
encontros na igreja se repetiam.
Em um domingo, conversando, disse a ela que o
meu maior desejo era ir a Terra Santa, mas tinha medo até de pensar, porque
sabia que seria impossível, as condições financeiras eram precárias, nos
mantinham com costuras e sempre era a conta, não sobrava para economizar... Para
minha surpresa, ela respondeu-me, “é meu desejo também... Vamos começar a
pesquisar, para ver como precisamos fazer?” “Se não der, pelo menos tentamos a
senhora não acha?”
Naquela hora... Acendeu uma chama no meu
coração... Ninguém nunca tinha me tocado assim com palavras tão convincentes! Fiquei
a semana toda, pensando... Pensando... E pedindo a Deus, se fosse para dar
certo que Ele tomasse conta. Naquela mesma semana, minha amiga, vou chama-la
assim, foi a serviço do banco que ela trabalha em Uberaba, no horário do almoço
foi na igreja de Nossa Senhora das Graças da Medalha Milagrosa, rezou, fez as
orações e saiu, depois lembrou que não tinha rezado para São José, voltou até a
imagem do santo, se ajoelhou e rezou...
Só que pregado na imagem tinha um cartão
escrito, "viagens para Terra Santa com poupança programada" e o
telefone; ela anotou na mão, chegou ao banco e ligou, responderam pra ela que
iriam mandar o prospecto da viagem e uma novena de São José, ele era o
padroeiro da viagem, podia ficar tranquila que ia dar certo. Não demorou, o
correio entregou o prospecto com a novena, como todos os dias ela passava em
minha porta, era seu caminho, me dava as noticias. Mas era muito caro o preço, pesava
muito pra mim, e até pra ela também, mas a animação foi só aumentando, contei
para o marido e os filhos, alertaram-nos que aqueles lugares do roteiro, estavam
em guerra, seria muito perigoso!
Mas não pensávamos no pior, só no melhor... O
meu genro Nei, rolava no chão e ria, dizia minha sogra agora pirou mesmo vamos
precisar interna-la. Então, começamos a novena, antes de terminar a mesma, minha
amiga recebe uma carta da colega de Recife, contando que tinha chegado da Terra
Santa, que tinha ficado muito emocionada e que estavam montando outro grupo
para final de outubro que ia voltar e levar a mãe, falou também que restava um
lugar e tinha pensado nela.
Minha amiga respondeu que gostaria muito, agradeceu
e disse que precisaria de dois lugares, não teria coragem de ir sem mim. Enquanto
isso, tudo indicava que São José estava providenciando... Todo dinheiro que eu
recebia trocava em dólares e escondia dentro de uma lata, com medo de ladrão
entrar e levar costurava dia e noite não me cansava, o serviço saia tão rápido
e perfeito que costurava uma manga, quando ia costurar a outra já estava
pronta, tudo acontecia sem esperar.
Tem coisas que me aconteceram que nunca tive
coragem de contar, as pessoas não acreditam e levam para o lado de gozações... Estávamos no mês de junho, fazia muito frio, perto da minha casa estava
acampada uma família com muitas crianças, precisavam de cuidados, a mãe era
cega e a barraca pequena, eu cuidava da minha casa das costuras fazia bolo, esquentava
leite, corria lá, levava, pedia para os vizinhos pão, levava, pedia cobertas
para as freguesas e agasalhos para as crianças.
Era um tempo corrido! Ainda conseguia tempo
para rezar o terço com eles à tarde, e correr atrás de políticos para arranjar
emprego para aquele senhor pai das crianças.
Na metade da segunda novena a colega de minha
amiga liga pra ela e diz que havia uma desistência no grupo sendo assim teria
um lugar pra mim, era preciso só depositar o valor de duzentos dólares para
garantir. Passou o numero da conta em Recife, o nome da pessoa não era o
coordenador da viagem ele não tinha conta em banco, falei com minha filha
Selma, ela me deu o cheque para depositar, ficamos apreensivas, não conhecíamos
as pessoas só minha amiga conhecia a colega Salomé, o tempo estava apertando, eu
abria a bíblia e saia aquela passagem "pode comer e beber tranquilamente o
perfume será derramado sobre sua cabeça." então eu chorava mostrava pra
Selma, ela me tranquilizava e dizia você vai, ajunta seus dólares, quando
faltar poucos dias, contamos, o que faltar vou ao banco e faço um empréstimo já
conversei com o gerente.
Voltava pra minha casa, ia fazer novena, ia
levar comida para a família, ia costurar... Pensei, na ultima hora se for
preciso vendo o carro, é meu mesmo depois dou jeito de comprar outro quando
chegar. Meu marido só dizia, "vai procurar sarna pra coçar... Com aquela
guerra!... Você não vai voltar"... Eu respondia "Morro feliz". Minha
amiga Joana, também corria atrás de dólares apesar dela ser bem remunerada, precisava
completar, fazia panos de pratos e vendia no banco, eu fiz rifas de uma joia
que havia comprado na Bahia, tudo era válido.
Olha dois mil e oitocentos dólares não era
muito pra outras pessoas, mas pra mim era... Meu dinheiro era muito sofrido... Pedir
ajuda só para caso de doença, passear para muitos é vaidade... É luxo... E logo
pra quem? Essa costureira pode tratar de ficar quieta... Isso seria muito! Pode
quietar o facho...
Faltava ainda um tempo para a data da viagem,
pensei agora vou vender o carro já tinha pensado no comprador, porém à noite
Kelly sai com a tia e uma amiga, na volta para casa, subindo uma avenida, não
devia estar devagar, entrou outro carro avançando a preferencial e bateu no
nosso, o fazendo capotar por duas vezes foi aquele Deus nos acuda, felizmente
as nossas meninas não se machucaram, mas o carro foi para o ferro velho, perda
total. Pela manhã Kelly chorava e dizia e agora mamãe, como você vai fazer...
Acabei com seu carro. Eu não me desesperei, o pai da moça que estava ao volante
prometeu que iria pagar o carro, mas tinha que esperar ele não tinha dinheiro
neste momento, fazer o que? Tinha que passar a metade do dinheiro para as
passagens, em outro numero de conta de outra pessoa que também não conheciamos
às vezes mandava recados pelo telefone, começaram a suspeitar que fosse
golpe... E as passagens? "vocês vão pegar em São Paulo, com as pessoas da
canção Nova”, também não conhecia ninguém, chegamos a pensar é fria... Meu
genro Geraldo, perguntou, ä senhora vai com quem?”Disse não sei”! Como chama a
pessoa que vai levar o grupo? Não sei! O recibo do banco está no nome do
coordenador? Não, de outra pessoa... Então vão pra São Paulo, sem passagens,
sem nome de ninguém e vão embarcar as quinze e trinta para Terra Santa! A
senhora acha que tá correto? Vou ficar em casa se der errado me liga vou buscar
a senhora.
Então, isso foi em uma quinta feira treze de
outubro, na quarta tinha sido o aniversário de meu pai, eu não fui porque tinha
que viajar na quinta, mas todos os irmãos foram o Marcio que mora em Curvelo
foi com esposa e um filho pequeno, voltavam para casa de carro com o filho
dormindo nos braços, e outro irmão Vivaldo dirigindo,quando uma caminhonete
dirigida por um bêbado veio e bateu no carro, acidente terrível meu sobrinho
morreu e meus dois irmãos se machucaram muito, nem sei contar direito, só sei
que não me contaram nada para não me preocupar.
Eu via as filhas com os olhos vermelhos
disfarçando, dizendo que estavam tristes porque eu iria demorar etc. Esqueci o
principal, faltando três dias para a viagem, juntaram meus filhos em volta de
uma mesa, busquei a lata do dinheiro para contar e vê quanto faltava, advinha?
Passava seiscentos dólares veja a felicidade!...
Viajamos naquela noite de quinta feira treze de
outubro para São Paulo, chegamos pela manhã e fomos direto para Guarulhos, ainda
estava muito cedo, fomos à capela do aeroporto, a missa começava, participamos,
tínhamos todo tempo do mundo, só não tínhamos as passagens e a certeza de ir...
Mais tarde assentadas no saguão, começou a chegar pessoas comentando sobre a
ida a Terra Santa, o assunto nos interessava, pois esperávamos o pessoal da
Canção Nova! Mas nada de ninguém nos procurar... Quase na hora do chek in, a
Joana ouviu uma voz, e me disse essa voz eu já ouvi na rádio da Canção Nova! É
do Eto, era um grupinho de diversas pessoas, então a Joana perguntou, “vocês
são da Canção Nova?” “Sim, e vocês são Joana e d. Zélia?” “Estamos com os
bilhetes de vocês,” e nos entregou, corri ao telefone, fiz uma ligação a cobrar
para meu genro Geraldo avisando que estava tudo certo e que sentíamos muito
felizes. Partimos para Recife, lá o grupo completou-se, éramos sessenta e
quatro participantes, tinha pessoas de todas as partes do Brasil.
Esse pacote tinha duração de trinta dias, teríamos
um curso bíblico na Terra Santa, quer coisa mais maravilhosa? Eu chorava de
felicidade, jamais tinha imaginado que isso fosse acontecer ainda mais daquela
maneira, o passeio era perfeito... Completo aos nossos desejos...
O restante dos dólares fui entregar para o
coordenador Gilberto, agora já tinha sido nos apresentado, dava para confiar
inteiramente, correto seguro, pessoa de confiança, ele não quis receber
preferiu que entregasse na volta, então fiquei com a responsabilidade de
carregar aquele dinheiro, ainda me disse, “pode pagar depois tem gente que deu
cheques pré-datados, a senhora não se preocupe!” Pensei olha só, como estava
ansiosa... São José é mesmo caprichoso... De Recife, fomos direto a Portugal,
em Fátima, fiquei encantada com tudo que via e ouvia a procissão das velas no
campanário, as missas celebradas em diversos idiomas, ficamos lá quatro dias,
não tinham pressa, tudo muito organizado fomos à casa dos pastorzinhos a gruta
das aparições.
De Portugal, para Tel-aviv, depois Jerusalém, ai
começou a verdadeira caminhada, vivenciando cada momento dos acontecimentos na
vida de Jesus, as passagens da bíblia vivida ali. Um Frei foi o nosso guia, ele
morou no Brasil e falava nossa língua com perfeição, Com rádios de comunicação,
ele ia aplicando o curso bíblico. Naqueles lugares, que podiam nem ser iguais
por causa de tantas destruições, muitos subterrâneos, pelas mudanças de
estruturas.
Era época de guerra, lá sempre estava em combate
é assim o povo não tem nossa paz. Os tanques nas ruas são normais ninguém se
assusta... Simplesmente entraram no ritmo da cidade, gritos e corre corre a
toda hora, homens e moças armados até os dentes... E eu estava muito feliz... Um
sonho sendo realisado... Ofegante... Coração apertado de prazer... Eram mil
novecentos e noventa e quatro. LEMBROU AGORA? AQUELE SOL EM FORMA DE QUATRO? A
história vai continuar... Verão mais adiante o desenrolar maravilhoso...